Como lidar com as dificuldades para começar a praticar mindfulness?
Marcelo Demarzo
06/03/2019 04h00
Crédito: iStock
Introduzir mindfulness em nossa vida diária envolve uma mudança de hábito tão desafiadora quanto começar a fazer exercícios físicos regulares, mudar a dieta ou deixar de fumar. Para tomar a decisão de alterar hábitos de vida nós fazemos uma avaliação de maneira mais ou menos consciente das vantagens e desvantagens do novo comportamento.
No caso de mindfulness, as pessoas em geral veem vantagens como uma maior sensação de bem-estar físico e psicológico, maior capacidade de atenção e memória, e melhor manejo dos pensamentos e emoções. Como desvantagens, as pessoas costumam relatar falta de tempo ou estar muito cansado para meditar, tédio ou monotonia durante as práticas, conflito com a própria prática religiosa, ou falta de disciplina.
Como podemos ver, qualquer mudança de hábitos é complicada, pois envolve tomar decisões. Os benefícios com mais eficácia para nos ajudarem a a tomar a decisão de praticar mindfulness não são os indiretos (os que ocorrerão no futuro), mas sim os diretos, aqueles criados durante o próprio processo da meditação.
Esses benefícios consistem na coerência entre a meditação e os nossos valores e princípios, ou nas sensações de bem-estar e conexão consigo mesmo, que podem surgir durante a meditação. É isto que mais nos motivará a mudar. De fato, professores de mindfulness já comprovaram que as primeiras experiências que uma pessoa tem quando começa a praticar vão predizer, com bastante segurança, se ela continuará praticando no futuro.
Aqueles que consideram as sessões iniciais agradáveis e úteis tendem a manter a prática. Entretanto, é menos provável que as pessoas que mostram rejeição ou demasiada resistência nas primeiras sessões continuem praticando.
A recomendação nesse segundo caso, quando possível, é dar uma "margem de crédito à meditação", cultivar a paciência e a confiança, da mesma forma que fazemos com alguns medicamentos, como os antidepressivos, ou seja confiando que os benefícios virão com a regularidade e o tempo. Portanto, a motivação adequada é a chave para a adesão às práticas e sua manutenção.
Alguns conselhos são importantes para qualquer pessoa que deseje iniciar e manter uma prática regular de mindfulness ou de meditação. Basicamente, deve-se considerar, em especial no início, quando ainda estamos criando o novo hábito:
Onde meditar?
O principal é escolher um lugar tranquilo, de temperatura agradável, onde fiquemos à vontade e com poucas distrações, sabendo que ninguém nos interromperá. O ideal é que não haja barulho. Se não pudermos evitar ruídos, uma alternativa é o uso de protetores auriculares que nos isolem do barulho. Não é recomendável meditar com música, pois gera mais distração e encobre de modo artificial o funcionamento habitual da mente.
Ao meditar em casa, convém escolher sempre o mesmo lugar. O estabelecimento de uma rotina facilita a mudança de hábitos. O simples fato de nos sentarmos no local de meditação – se for sempre o mesmo – já promoverá uma atitude receptiva.
Quando meditar?
É preferível reservar um tempo fixo na agenda para as práticas formais diárias (meditações). No entanto, meditar em qualquer momento ou em qualquer lugar, ainda que inesperado, é melhor que não meditar. A regularidade das práticas formais é muito importante para obtermos os benefícios de mindfulness e funciona também como lembrete (reminder) para a incorporação de práticas informais (levar o estado mental de mindfulness para coisas cotidianas, como a alimentação) em nosso dia a dia.
Os melhores momentos do dia costumam ser pela manhã (ao levantar-se) e à noite (antes de jantar ou de dormir). Entretanto, quando não se pode seguir esses horários por motivos profissionais ou familiares, qualquer momento do dia é melhor do que nada.
Durante quanto tempo devemos meditar?
Em relação à duração da prática, é preferível começar com períodos curtos (de 5 a 10 minutos) e, em seguida, aumentar o tempo gradativamente, de acordo com as possibilidades e necessidades de cada um. É melhor que as meditações sejam curtas no começo, assim teremos vontade de repeti-las; se forem demasiadamente longas, as abandonaremos. Um erro frequente entre os meditadores novos é estender muito o tempo de meditação. Acabam ficando esgotados em poucas semanas, pois sentem que a prática lhes toma muito tempo. Com a regularidade é fundamental, realizar as práticas de maneira diária e sistemática produz maiores benefícios do que práticas mais longas, porém esporádicas.
Vamos praticar?
Referência:
Demarzo & Garcia-Campayo. Manual Prático de Mindfulness: curiosidade e aceitação. Editora Palas Athena, 2015.
Para saber mais sobre mindfulness:
www.mindfulnessbrasil.com (Mente Aberta – Centro Brasileiro de Mindfulness e Promoção da Saúde – UNIFESP)
www.webmindfulness.com (WebMindfulness – Grupo de Pesquisa Coordenado pelo Prof. Javier García-Campayo – Universidad de Zaragoza, informações em espanhol)
www.umassmed.edu/cfm (Centro de Meditação "Mindfulness" na Medicina, Universidade de Massachusetts, Estados Unidos, informações em inglês)
Sobre o autor
Marcelo Demarzo é médico especialista em mindfulness (atenção plena), professor e pesquisador na área de medicina, saúde e bem-estar. Ministra cursos e palestras sobre estilo de vida mindful, bem-estar e saúde --expertise desenvolvida em 15 anos como professor e pesquisador em vários hospitais e universidades brasileiras (UNIFESP, USP, Hospital Israelita Albert Einstein) e internacionais (Universidade de Oxford, Universidade de Zaragoza, Harvard University). É autor de livros e estudos científicos relacionados ao tema de mindfulness e qualidade de vida e realiza dezenas de atendimentos individuais e em grupo para disseminar o conceito de mindful living (viver pleno e consciente). É coordenador da Especialização em Mindfulness da UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo).
Sobre o blog
Dicas e reportagens sobre saúde e qualidade de vida, com foco em mindfulness e bem-estar. Um espaço interativo para conversarmos sobre como desenvolver um estilo de vida mais mindful (pleno e consciente), que irá ajudá-lo a lidar melhor com o estresse, algo tão comum na nossa vida atual.