Sonolência e dor: desafios físicos para a prática da meditação mindfulness
Marcelo Demarzo
08/05/2019 04h00
Crédito: iStock
A prática das meditações do tipo mindfulness podem trazer desafios físicos e psicológicos, em especial quando estamos iniciando o treinamento. É importante conhecê-los e saber como manejá-los, assim não desistimos de praticar. Hoje tratarei dos 2 desafios físicos mais comuns:
Sonolência
É o mais comum e relatado pelos praticantes iniciantes (e mesmo os avançados). Muitas pessoas experimentam sonolência quando começam a meditar.
Em geral, estamos tão acostumados à atividade e ao estímulo mental, que a sensação de "parar" um pouco ao meditar pode nos levar naturalmente a esse estado. Como sabemos, o objetivo de mindfulness não é dormir, pois as potenciais mudanças psicológicas e físicas que a prática de mindfulness produz requerem que o indivíduo esteja desperto. Assim, é importante analisar os fatores físicos que podem induzir ao sono, para lidarmos melhor com os mesmos.
Uma causa comum é fato de fecharmos os olhos durante a meditação (pois facilita a percepção interna, por exemplo da respiração), assim se houver sonolência, uma dica simples é simplesmente abrir ou entreabrir os olhos (não é obrigatório ficar de olhos fechados).
Outras causas comuns são praticar após as refeições (se não der pra evitar, sugere-se que a alimentação seja leve); ou estamos muito cansados, seja por excesso de trabalho físico ou porque dormimos mal, e o mais sensato nesses casos, quando possível, é nos recuperarmos ou descansarmos antes de começarmos a meditar.
Se a sonolência for leve e manejável, uma dica é simplesmente ajustar o corpo (reequilibrar o corpo), ou fazer algumas inspirações mais profundas, para "ativar' um pouco.
Dor ou Desconforto
A dor está, em geral, associada a certas posturas de meditação, como a postura de lótus e de semilótus, consideradas muito importantes em algumas tradições. Em mindfulness a postura é muito mais livre e cômoda, como por exemplo sentado confortavelmente em uma cadeira, com o corpo um pouco mais erguido e estável.
Apesar disso é possível experimentar um pouco de dor ou desconforto em meditações mais longas. Um primeiro aspecto é tentar identificar qual a origem do desconforto (roupa inadequada para a meditação, posição imprópria, alguma causa física ou doença pré-existente) e tomar as medidas necessárias para cada caso.
Em geral, o desconforto vem de uma postura inadequada (ou no início ou durante a prática), e a dica aqui é simplesmente ajustar a postura (ou antes ou durante a prática) para que ela volte a ficar estável e cômoda (sim, nós podemos movimentar ou ajustar o corpo durante a meditação, e a ideia é que façamos isso também com atenção plena). Se o problema persistir, ou se a causa for física, relacionada ou não a uma doença, é fundamental conversar com um instrutor qualificado.
Entretanto, apesar de termos tomado as medidas necessárias para resolver a dor ou desconforto – e mesmo com anos de prática – em algumas ocasiões é normal sentir um pouco de dor durante a meditação, assim como é frequente experimentar um pouco de mal-estar, de vez em quando, no dia a dia.
Para essa dor residual, de pequena intensidade, mas muitas vezes inevitável (como é o caso dos quadros de dor crônica), o que se recomenda na prática de mindfulness é convertê-la no objeto de meditação, ou seja, transformar a dor ou desconforto no foco da atenção, mas com suavidade e curiosidade (sem forçar).
Por exemplo, uma dica simples é imaginar que estamos respirando com aquele ponto de tensão ou desconforto, em mantermos a atenção ali por alguns instantes (novamente, sem forçar). Assim, ao invés de resistirmos ou termos aversão ao desconforto, há uma aproximação. Parece contra-intuitivo, mas ao fazermos isso, mudamos a perspectiva sobre a dor, e o manejo fica mais natural (menos sofrido).
Vamos praticar?
Um convite: Quer saber mais sobre a ciência por trás de mindfulness? Venha participar do VI International Meeting on Mindfulness (São Paulo, 12-15 de junho de 2019): www.mindfulnessmeeting.com
Referência:
Demarzo & Garcia-Campayo. Manual Prático de Mindfulness: curiosidade e aceitação. Editora Palas Athena, 2015.
Para saber mais sobre mindfulness:
www.mindfulnessbrasil.com (Mente Aberta – Centro Brasileiro de Mindfulness e Promoção da Saúde – UNIFESP)
www.webmindfulness.com (WebMindfulness – Grupo de Pesquisa Coordenado pelo Prof. Javier García-Campayo – Universidad de Zaragoza, informações em espanhol)
www.umassmed.edu/cfm (Centro de Meditação "Mindfulness" na Medicina, Universidade de Massachusetts, Estados Unidos, informações em inglês)
Sobre o autor
Marcelo Demarzo é médico especialista em mindfulness (atenção plena), professor e pesquisador na área de medicina, saúde e bem-estar. Ministra cursos e palestras sobre estilo de vida mindful, bem-estar e saúde --expertise desenvolvida em 15 anos como professor e pesquisador em vários hospitais e universidades brasileiras (UNIFESP, USP, Hospital Israelita Albert Einstein) e internacionais (Universidade de Oxford, Universidade de Zaragoza, Harvard University). É autor de livros e estudos científicos relacionados ao tema de mindfulness e qualidade de vida e realiza dezenas de atendimentos individuais e em grupo para disseminar o conceito de mindful living (viver pleno e consciente). É coordenador da Especialização em Mindfulness da UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo).
Sobre o blog
Dicas e reportagens sobre saúde e qualidade de vida, com foco em mindfulness e bem-estar. Um espaço interativo para conversarmos sobre como desenvolver um estilo de vida mais mindful (pleno e consciente), que irá ajudá-lo a lidar melhor com o estresse, algo tão comum na nossa vida atual.